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Na mesma velocidade que as carruagens


Conhecido por suas intervenções artísticas com foco no meio ambiente, o artista Eduardo Srur colocou, em setembro de 2012, uma carruagem imperial com quatro cavalos esculpidos em escala real a mais de 30 metros de altura no mastro da ponte Octávio Frias de Oliveira, na marginal Pinheiros, em São Paulo.

A obra comparava a velocidade média de deslocamento de um carro no trânsito paulistano no horário de pico com a velocidade de uma carruagem nos tempos do Império. Ambos movimentam-se a lentos 20 quilômetros por hora.

Trata-se de uma apropriação da arquitetura do cartão-postal da metrópole para denunciar a transformação da paisagem urbana e criar um novo olhar sobre a cidade.

O trabalho de Srur foi muitíssimo apropriado. Afinal, hoje, em pleno século XXI, nos movemos na mesma velocidade do que no final do século XIX, quando carruagens e charretes ocupavam as vias.

Naquela época, a mobilidade nas principais cidades do mundo dependia muito mais da tração animal do que de veículos automotivos.

Carruagens e charretes puxadas por cavalos ocupavam os leitos carroçáveis das cidades. Os veículos automotivos começavam a surgir no cenário urbano, onde bondes elétricos já faziam parte do cotidiano. Nesta época a velocidade média de deslocamento ficava em torno dos 20 km/h. Atualmente a velocidade média de um carro, potente ou não, durante o horário de pico, é também de apenas 20 km/h. Em alguns casos pode ser ainda menor.

É incrível que hoje, usando veículos com até 220 cavalos de potência mecânica, estejamos desperdiçando mais tempo no ir e vir do que há 120 anos, quando somente poucos cavalos puxavam as carruagens.

Naquela época, as cidades eram significativamente menores, tanto em tamanho quanto em população. Assim, as distâncias médias percorridas também eram muito menores.

Obviamente, se a velocidade média não aumentou, mas as distâncias sim, o tempo e a energia desperdiçados nos trajetos somente crescerem. E cresceram tanto que esse é um dos grandes impactos na qualidade de vida. A maioria das pessoas não consegue morar perto do trabalho, o que torna a rotina do ir e vir um processo moroso e desgastante.

Também contribuem para isso a falta de planejamento e de investimento no sistema viário e a frenética verticalização dos bairros.

O modelo de São Paulo vem sendo estupidamente replicado em outras cidades brasileiras: quarteirões inteiros de casas são demolidos repentinamente para dar lugar a torres e mais torres de edifícios residenciais e comerciais.

E como esse processo ocorre sem que o sistema viário seja ampliado para ter mais calçadas, ciclovias e faixas de ônibus, as ruas se comportam como artérias entupidas de um organismo prestes a enfartar.

Para desobstruir as ruas e trazer saúde geral às cidades e às pessoas é preciso uma operação preventiva conjunta, com governos, empresários, incorporadores imobiliários e cidadãos, cada um fazendo a sua parte e todos pensando coletivamente e não por causa de seus interesses individuais. Não adianta somente privatizar o lucro quando os prejuízos são sempre socializados. Utopia ou não, é um jeito de melhorarmos desde os tempos das carroças e charretes.

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