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  • Por Darlene Dalto

Paraísos à vista


Passar o dia todo em cima de uma bicicleta, pedalar sozinho pelo mundo encontrando gente bacana em meio às paisagens mais lindas... Esse pode ser o sonho de muita gente, não é? Para o ciclista e Bike Anjo pernambucano Enio Paipa, de 32 anos, literalmente deixou de ser sonho para se transformar em vida real. Em abril de 2018 ele deixou Janga, bairro no litoral sul do município de Paulista, em Pernambuco, com exatos 100 dólares no bolso. A ideia era percorrer a América do Sul. Uns seis pneus furados e quase 20 mil quilômetros depois, nenhum tombo mais sério e um gasto total em torno de R$ 10 mil – e sua bicicleta Merida Cross Way roubada e logo substituída por uma Kross Trans Global –, ele voltou para casa em março último por causa da pandemia. Viagem de quase dois anos com mil e uma aventuras. Não podia estar mais feliz. E, claro, só pensa em voltar ao pedal.

O amor pelas bicicletas começou ali mesmo, em Janga, na rua sem asfalto de sua casa, de um lado o mar, de outro o mangue e de outro ainda a mata atlântica. Em meio a tantas brincadeiras de criança, bolinha de gude, futebol e pipa, a bicicleta era só mais uma. Conta que aprendeu sozinho em Fortaleza, nas férias na casa da tia Bil, primos e primas sempre reunidos no quintal. O primeiro tombo, ele não se esquece: acreditando que já dominava o brinquedo, pedalou mais forte, mais forte e mais forte, até que não deu conta da curva, o quintal não era tão grande... Nada grave. Acabou se equilibrando. Para sempre.

Leleque, Chubut, no sul da Argentina

De volta à sua casa, dividiu por um bom tempo a bicicleta com seu irmão Almir. Até hoje essa rua de terra tem o gosto da sua infância, com menos crianças, é verdade, principalmente por causa dos celulares, que todo mundo ali tem um à disposição. A vida seguiu, Enio se formou em contabilidade em Paulista, não muito longe. Já usava a bicicleta como meio de transporte.

A vontade de fazer uma grande viagem em cima de uma bike veio quando ele já era adulto e ouviu falar em Felipe Cesar, que tinha dado uma volta ao mundo sobre duas rodas e passou rapidamente por Janga. Com o tempo Enio entrou em contato com ele, ficaram amigos até hoje. “Felipe me dizia que a coisa toda era bem mais simples do que parecia”, lembra. Sonho de gente grande, ele começou a planejar, mas não muito, e logo se pôs no caminho.

A amiga argentina Luci em Lagoa la Cocha, em Nariño, Colombia

Com perto de 70 quilos na bagagem, começou indo em direção a Bogotá, capital da Colômbia, mas de avião. E de lá, de bicicleta, para o caribe colombiano, Equador e Peru até os Andes, depois a Bolívia, o Chile, o Pacífico, a Argentina e o Uruguai, mais 500 quilômetros pelo Brasil até Porto Alegre, onde foi obrigado a abortar a viagem. “Deixei minha bicicleta e uma boa parte do meu equipamento com a senhora Marcia, do Camping do Vô Tarso, na Lagoa dos Patos, em Tavares. Assim que puder vou buscar tudo”.

Enio no Salar de Uyuni, na Bolívia

Los Cipreses, vila em Chubut, no sul da Argentina, perto da fronteira com o Chile

Em Vila Llanquín, na província de Río Negro, na Argentina

Cânion Del Pato, no Peru

O início talvez tenha sido o mais difícil. Ele não pretende voltar tão cedo para as montanhas colombianas conhecidas como Trampolim de La Muerte. Região inóspita, cheia de estradas sinuosas, sem asfalto, com pedras soltas e areias escorregadias, perigosas, sem qualquer sinalização. Um sobe e desce interminável. “Ali acabei ficando sem freio e fiz os últimos cinco quilômetros empurrando a bicicleta. Felizmente precisei empurrar a bike só ali”.

Dessa viagem ele jamais vai esquecer os pores de sol e o céu que conheceu em Trujilo, no Peru. Ou as paisagens mágicas do Salar de Uyuni, no sudoeste da Bolívia, a beleza da praia de Niebla, onde sua bike foi roubada, perto de Valdívia, no Chile. “Não existem estradas definidas no salar, tudo é branco. Você vai percorrendo os trajetos feitos por carros, seguindo as marcas de pneus que eles deixaram. Nem sempre é o melhor caminho ou o caminho mais curto, mas é o possível naquele momento”.

Lagoa la Cocha, em Nariño, na Colômbia

Bicicletada em Lima, no Peru

Além de imagens verdadeiramente inesquecíveis, Enio foi fazendo amigos pelo caminho, gente muito bacana com quem ainda mantém contato. Como Chepe, amigo de El Salvador que conheceu em Medelin, na Colômbia; ou a argentina Luci, que encontrou pela primeira vez em Dos Quebradas, também na Colômbia; Melissa e Lauti, casal de argentinos que conheceu em Cusco, no Peru. “Às vezes o trajeto é o mesmo e a gente vai junto. Depois se separa em algum momento. Mas fica a amizade, o carinho”.

E gente muito bacana, que ele já conhecia, acabou sendo fundamental para que a sua viagem pudesse continuar. “Como saí do Brasil com pouco dinheiro, sabia que precisaria encontrar uma forma de me manter. Trabalhei em alguns lugares, em fazendas, nas colheitas ou cuidando de animais, por exemplo, e também lancei um pedido de ajuda pela internet. Um grupo de amigos me ajudou o tempo todo, eles faziam depósitos da maneira que podiam. Foram importantíssimos”.

No começo ele arriscou um blog. Mas as aventuras todas se sobrepuseram e o blog ficou para trás. Restou seu instagram @eniopaipa para quem quiser conhecer parte do seu caminho. Logo ele volta.

Vida de Bike é uma parceria do Pro Coletivo e Bike Anjo

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