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  • Texto e fotos de Carlos Monteiro

Rio 456


O Rio amanheceu dourado, afinal não é todo dia que a jovem senhora, cidade de encantos mil, chega a essa idade em série. Para mim é um número cabalístico; meu primeiro endereço, na cidade em que nasci, fica exatamente no número 456 da Joaquim Murtinho, em Santa Teresa. O mais bucólico entre os bucólicos bairros da Cidade Maravilhosa, que já foi Capital Federal, tem bondinhos a deslizar sobre os prateados trilhos com ruas em paralelepípedos.


Desde as primeiras luzes, que anunciavam o amanhecer, o céu, costumeiramente em fogo, dourou-se exprimindo sua maior vocação: ser Rio! Rio de alegria e festa, de feli(z)cidade e de natureza esplendorosa. As fragatas não poderiam escolher melhor cenário para o ensaio de seu sensual balé em homenagem a este dia tão especial.

As montanhas solares em brilho exaltam a Cidade Maravilhosa. O Sol, por sua vez, em malabares mil, apoia-se na "Parabólica Camará", no seu exercício diário de se equilibrar no topo dos prédios. A cidade acorda preguiçosa, vagarosamente, afinal hoje é dia de festa! Vamos cantar-te, parabéns!


Como não amar o viço tropical e o aroma matinal de virgens selvas e de oceano largo como e quando sorris; Rio caudaloso, cachoeira em esplendor pleno, mar revolto, carinhoso ao afagar as areias. Às vezes rude, dolorosa e pecaminosa cidade, mas te amamos de qualquer forma! Deusa principesca, musa mágica maravilhosamente mar, amar, há mar, ao mar, o mar. A amamos com a força das paixões fugidias e arrebatadoras. Como é bom poder cantar-te em versos, contar-te segredos, os mais profundos, encostado a ti. Fazer-te arder em fogo, deleitar-se em quimeras, utópicas, encantadoras mil. Gracejo retumbante, magnetismo, magnética rubra, desse meu não querer mais que bem-querer.

Linda, no que se apresenta, o triste se ausenta... É o Mestre Cartola cantarolando lá do céu, em versos e trovas da aurora. Ele dá um bom dia à Cidade Maravilhosa, entoando e entonando mais que amor, mais que paixão, mais que tudo.


O céu quase de brigadeiro se mantém firme e forte, nada teme, deixando o ciclorama límpido, translúcido, fluido. Apenas uma teimosa stratus se faz presente para lá do firmamento. Tons alaranjados a emolduram.


O Astro-Rei teima em equilibrar-se no topo das montanhas, se respaldando entre o pseudo vale que se forma e a pequenina nuvem que, faceira, o enquadra. Arraia na Muy Leal e Heroica Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro...

O Rio é movido pelo gás da carioquice, é esse gás que nós, cariocas apaixonados, precisamos injetar nas veias, num Rio que não é só de praias, num Rio que tem o Parque de Madureira. Tem altinha e frescobol; tem biscoito Globo e mate-limão do galão; tem aplauso ao pôr do Sol à Leonam. Tem um ‘porra’ antes de iniciar qualquer frase, tem ‘mermão sim. Tem fezinha no poste, porrinha na disputa do café, amendoim aquecido na lata de banha. Tem Cristo Redentor encimando o Corcovado amparando com seus braços abertos toda a Guanabara. Abençoa, protege, zela pelos moradores. Monumental, altaneiro, estátua majestosa do amor carioca. Tem passeio de biguás ‘pra’ lá e ‘pra’ cá, tem Pão de Açúcar, tem Catedral em forma de pirâmide.


Tem tudo isso e muito mais, sabe por quê? Porra, porque somos felizes. Qual a cidade no mundo pode se gabar de ‘rio de janeiro a janeiro’. Qual cidade tem o privilégio de uma sinfonia cujo seu compositor, o maestro que deu tom às cores e as sonoridades, ter uma samaúma como amiga?

A Garota de Ipanema, Os Inocentes do Leblon, o Menino do Rio. Esta cidade, um misto de Vininha, Drummond e Caetano embala a noite em canções de ninar e, já na alta madrugada, depois do deleite de encantos mil, o poeta retorna com seu violão, o boêmio, já cansado em tantas serenatas, volta; a bailarina já dorme, abraçada às sapatilhas, e o funcionário acorda para mais um pão nosso de cada dia, vamos comemorar com a menina do anel de Lua e estrela, raio de sol cabelo cor de girassol, ou será abóbora, All Star azul nas Laranjeiras. Vamos nessa pela praia até o Leblon depois de um chope gelado em Copacabana.

O Rio flui, o Rio amanhece, à tardinha cai e o barquinho vai, anoitece, enobrece. O Rio da Fernanda, do Ruy, da Heloisa, dos Chicos – o Buarque e o Alencar –, do Cartola, do Ferrez, do Tom, do Millor, do Carvana, da Odete, da Ciata, do Malta, do Amaral, do Cartola, do Lan, do Rubem, do Barreto, do Paiva, do Paulinho, do Zózimo, do Joaquim Ferreira dos Santos, do Roniquito, do Afonsinho, do Pepê, do Machado, da Helô Pinheiro, do Noel, do Zuenir, do Vinícius, do Haroldo, do Hugo Bidê, do Zé Carioca, de Martinho, do Seu Zé, do Passos, da Dona Ivone, da Leila Diniz. O Rio do Pasquim, do Sol, do JB... É outro dia.


Parabéns ‘feli(z)cidade’. Parabéns, Rio.


Valeu Estácio de Sá!



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