Novos horizontes
“Tentaram me ensinar a pedalar na primeira infância, acho que foi minha mãe, mas sem sucesso”, conta o fisioterapeuta Pedro Matsumoto, bike anjo de Niterói. Passou o tempo e, aos dez anos, ele pediu emprestada a bicicleta de uma vizinha. “Ela tinha uma Cecizinha aro 20 novinha, e a mãe não deixava que emprestasse. Mas um dia ela estava sozinha, eu pedi para dar uma volta, e disse: ‘Mas eu não sei andar’. Ela deixou assim mesmo, eu subi na bicicleta e dei a volta no quarteirão. Então aprendi sozinho, e de repente, aos dez anos”.
Durante a adolescência Pedro teve uma Caloi Cross aro 20, que ele usava para pedalar no bairro onde morava; aos 18, comprou uma Caloi aro 26, que ficava na casa da sua tia, e ele só usava nos fins de semana; aos 20 entrou para a faculdade de Fisioterapia, e por causa da vida corrida e do trânsito perigoso, não pedalou mais.
Passaram-se quase vinte anos até que redescobrisse a bicicleta. Nesse período caminhou bastante e usou basicamente o transporte coletivo. Como fisioterapeuta e autônomo, sempre atendeu seus pacientes a domicílio, mas nem sempre os locais tinham fácil acesso. Morando com sua avó, para ajudá-la a melhorar das sequelas de um AVC, e indo trabalhar diariamente de ônibus, ele percebeu que gastava muito dinheiro com o transporte, além do calorão que encarava nos ônibus. “Niterói já contava com algumas ciclovias, então decidi comprar uma bicicleta para ir ao trabalho, e não parei mais. A partir desse dia me integrei à ciclomobilidade urbana e me entendi como um cicloativista”.
Há sete anos, Pedro se juntou à rede Bike Anjo com suas asas coloridas e seu humor contagiante. Um encontro feliz, que trouxe a esse niteroiense as melhores experiências com a bicicleta da sua vida. Entre elas, ele destaca a alegria de ajudar pessoas mais velhas a pedalar. “Ensinei um senhor de 86 anos, e isso foi muito emocionante. E também muitas senhoras com mais de 60, que diziam que pedalar era um sonho de uma vida inteira. Quando crianças e jovens, os pais não deixavam porque ‘isso não era coisa de menina’, e depois de casadas essa postura machista se repetia através dos maridos. Elas precisaram enviuvar para poder aprender”, observa Pedro, confessando que está com saudade desse sentimento, dessa emoção, uma vez que as atividades de bike anjo estão paradas devido à pandemia.
Com a bicicleta ele aprendeu que a cidade pode ser muito melhor e mais humana, e começou a olhar seus caminhos de outra forma, reparando na paisagem e nas pessoas. Também se tornou mais engajado nas lutas sociopolíticas: os desafios de ampliar a mobilidade urbana ativa, a pauta do feminismo, a batalha antirracista, as buscas por cultura e educação, por saúde e meio ambiente... “Sei que muitas ainda virão, ainda quero aprender muito sobre os Direitos Humanos, e passar essas aprendizagens adiante, para as próximas gerações, para futuros ciclistas, além de querer continuar ensinando pessoas a pedalar”.
O movimento e as causas LGBTPFQIA+ também estão presentes nas suas lutas diárias, inclusive quando ele atua no cicloativismo. “É necessário e de extrema importância que cada um de nós possa ter direito e liberdade de ser quem verdadeiramente é, e de amar do jeito que ama. Como diz a música “Paula e Bebeto”, do Milton Nascimento, ‘toda maneira de amar vale a pena!”
Para Pedro, a vida deveria ser medida em dois parâmetros, AB e DB (antes e depois da bicicleta). “Porque a bike é muito transformadora. Ela possibilita liberdade de movimento, de ir e vir, de escolhas, de expressão, de ocupação da cidade. A bicicleta é vida! Tenho uma frase, que ainda vou tatuar e colocar em camisetas, que é: ‘A bicicleta é o nosso primeiro desejo de liberdade’. Porque ela é uma das primeiras coisas que uma criança quer, e é a primeira dessas coisas que traz independência e nos leva a outros lugares, seja ali na esquina ou do outro lado do planeta”.
Empolgado, Pedro confessa que deseja ver o Brasil bem mais ciclável. “Vai ser lindo o dia em que Niterói for a Amsterdã do continente americano, vai ser incrível ver estradas adaptadas e seguras para cicloviajantes no Brasil inteiro. Pensar um mundo ciclável é pensar um mundo mais saudável, mais ecologicamente correto, um meio ambiente sem poluições de todos os tipos, um mundo mais humanizado, um mundo de, por e para pessoas. Bicicletem-se!”
Vida de Bike é uma parceria do Pro Coletivo e Bike Anjo
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